Книга - Principios e questões de philosophia politica (Vol. II)

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Principios e questões de philosophia politica (Vol. II)
António Cândido






Principios e questões de philosophia politica (Vol. II)





SUMMARIO


I Comprehensão actual do suffragio politico. Opiniões de Dupont White, Bluntschli, Wirouboff, Oliveira Martins. Antinomias d'aquelle facto social; diversas soluções para as reduzir; a que deve ser preferida. – II Estado da questão tratada n'este folheto: a votação deve ser uninominal, ou de muitos nomes? É, fundamentalmente, uma questão de anthropologia. A philosophia naturalista do seculo XVIII em contradicção com a moderna anthropologia. – III Historia da lista multipla (scrutin de liste) na França e entre nós. Tem por si as melhores tradições democraticas. Juizo de Gambetta sobre a revolução de 1848. Como a questão eleitoral foi considerada no nosso parlamento em 1859. – IV A lista multipla é preferivel ao voto uninominal. Tem, principalmente, a vantágem de inverter o suffragio, tornando-o indirecto. Porque foi inefficaz na constituição da assembléa franceza de 1871. Objecções contra a lista multipla. – V Analyse da primeira objecção. O suffragio directo é uma illusão; se tem de ser dirigido, antes o seja pelas grandes commissões dos partidos do que pelas influencias locaes. Este regimen produz, quasi sempre, as melhores assembléas legislativas. Importancia da imprensa n'este modo de eleger; sua justificação. – IV Analyse da segunda objecção. A lista multipla rompe a intimidade do eleitor com o seu representante. O sentimento pessoal não é da essencia do voto. Aquella intimidade produz as seguintes consequencias: rebaixa a lucta eleitoral, permitte a seducção pelo dinheiro, obriga os eleitos a um servilismo indecoroso. Demonstração. – VII É o regimen mais proprio para a formação de parlamentos fortes e de governos viaveis. É esta a sua maior excellencia n'este momento da civilisação occidental. Apreciação rapida do estado da França, da Italia, da Hespanha e de Portugal. A representação das minorias é compativel com a fortaleza dos governos. A lista multipla, só por si, permitte, até certo ponto, aquella representação. Demonstra-se isto. – VIII Commentario a uma phrase de Lord Derby. Considerações sobre o presente estado da civilisação politica. Perigos das agitações muito repetidas. Incerteza do futuro. Gravidade d'esta incerteza.




I


O suffragio politico, que é, desde muito, um facto consummado na vida dos povos mais cultos, está ainda longe de ser um raciocinio triumphante uma verdade positivamente liquidada nas especulações da sciencia.

Em quanto dominou o mundo a philosophia absoluta, que tinha a intuição por methodo principal, a discussão d'aquelle facto foi apaixonada, levou alguns interessados n'ella á prova extrema do martyrio, chegou a determinar uma formidavel revolução, que é um dos acontecimentos culminantes d'este seculo; mas a ponderação das suas difficuldades praticas e o verdadeiro conhecimento da sua indole, antinomica com irrecusaveis condições sociaes, são obra de outra escola, que antepõe a analyse ao enthusiasmo inconsciente e a realidade das cousas ao optimismo dos espiritos.

E não são já sómente os discipulos d'essa escola, os puritanos seguidores da philosophia experimental, que vêem no suffragio politico as difficuldades, que elle importa, e as contradicções, que elle encerra. Graças á influencia dos novos methodos, sentida ainda por aquelles que fazem gala de os combater, essa instituição do Direito Publico perdeu o falso prestigio sentimental que a aureolava, e é geralmente tida hoje pela mais perigosa de todas as funcções sociaes.

Ao invez de tantos que saudaram o suffragio generalisado como aurora d'uma liberdade viavel e fecunda, insignes publicistas de todos os matizes são attestes em consideral-o um mal gravissimo, a que urge applicar remedio. Dupont White qualifica a democracia de contra-senso, de pura chimera, porque entrega e confia o que a sociedade tem de mais difficil nas suas obras a quem é mais incapaz entre os seus membros, e para a mais alta das funcções, que é o governo, destina o mais grosseiro de todos os orgãos, o suffragio do povo![1 - Politique Actuelle, pag. 249.]. Bluntschli friza muitas vezes a mesma idéa, e, na violenta apprehensão que lhe causam os perigosos abusos do voto universal, propõe, como forçoso antecedente ao exercicio dos direitos politicos, o que elle chama consagração civica, uma especie de chrisma administrado pelo Estado, n'uma festa solemne, aos que a edade vai collocando na categoria de cidadãos[2 - La Politique, pag. 277 e 278.]. Wirouboff, o energico continuador de Littré, teve ainda ha pouco a coragem de dizer em plena França, no paiz classico do suffragio universal, que este, quando não era uma flagrante contradicção, não passava d'uma inanidade, a que a rhetorica constitucional revestia, a seu talante, toda a sorte de roupagens[3 - Les elections nouvelles et la vieille politique-Revue de la Phil. Posit., septembre-octobre, 1881.]. E, para produzirmos uma auctoridade nossa, transcrevemos as seguintes palavras de Oliveira Martins, o poderoso e brilhante escriptor, que dia a dia se habilita para exercitar gloriosamente o primado das letras portuguezas: «O descredito chegou a um ponto que os maiores amigos do systema são hoje os inimigos da liberdade. Os cesaristas são os primeiros defensores do suffragio universal, que a democracia, como partido, não teve ainda a coragem de confessar que é uma burla»[4 - As Eleições, pag. 24.N'este opusculo, fortemente pensado e escripto com grande eloquencia, procura o sr. Oliveira Martins resolver o problema eleitoral pela representação organica das categorias sociaes. Apreciando a obra do radicalismo individualista, que só foi excellente na sua parte critica, attribue-lhe com evidentissima razão a geral desordem de interesses e de idéas que caracterisa a evolução politica do nosso tempo. «Por ter cahido a crença no principio esoterico, onde se estribava a hierarchia das classes, cahiu tambem a organisação inteira. Ao apagar-se a luz dentro do sanctuario desabaram as paredes por terra. Em nome da liberdade prégou-se a destruição de tudo. Do principio de que em todos os homens havia capacidade juridica egual, deduziu-se o de que, entre os homens, eram todos aptos para tudo, e assentou-se em que á lei não cumpria especialisar funcções, nem dividir o trabalho, nem tornar independentes os orgãos sociaes. Opinou-se e fez-se. A sociedade passou, em nome da liberdade, a ser uma massa inorganica de homens, um cahos, onde os individuos, como os elementos nas edades geologicas, deixam debater e debatem os seus interesses e paixões, agitando-se á tôa, inteiramente entregues a si, e abrindo por tal fórma a era das revoluções e das crises permanentes ou successivas» (pag. 35).A observação é profunda e exacta. O gravissimo defeito da nossa civilisação está aqui apontado com coragem e verdade. Cahiu em descredito o optimismo dos que pensavam que as consciencias individuaes, libertas das pressões antigas, tinham, de propria iniciativa, o poder de se organisar, e que a solidariedade humana era um sentimento universal, independente de qualquer consagração politica. A reacção contra a concepção atomistica do Estado é um facto geral na mais moderna sciencia; mas, como é natural, não falta quem a exaggere fóra de termo e medida. O ultimo numero da Philosophia Positiva dá conta de um livro em que Armand Hayem intenta provar que as classes sociaes constituem fórmas tão irreductivas como as de especie e de raça! A verdade é muito menos do que isto. As classes têm um estreito laço de união, que é a communidade do mesmo interesse profissional, mas isso não é bastante para alterar as linhas predominantes na physionomia moral dos povos. A preoccupação profissional não é tão intensa que importe modificações organicas; por outro lado a successão dos officios ou misteres sociaes dentro das familias é excepcionada a cada momento.O sr. Oliveira Martins intenta remediar os inconvenientes do actual estado de cousas reestabelecendo a Ordem, não com o velho conteúdo d'este termo, mas com a realidade de todas as forças, de todos os elementos activos, que são o nervo e a substancia das nações. «Desde que a origem do Poder é immanente e social, o modo de tornar concreta ou positiva essa auctoridade é constituil-a por meio da reunião de todos os orgãos da sociedade n'um corpo uno. Esses orgãos são de varias naturezas: são as classes ou profissões, base economica da sociedade; são as escolas e as instituições, base intellectual e administrativa; são as regiões, base natural e geographica. A reunião d'esses orgãos constitue a sociedade, e o Estado, que a exprime syntheticamente, têm de formar-se por emanações ou delegações de cada um d'elles.» Os periodos transcriptos resumem o pensamento todo do eminente publicista, que, com Hartmann, considera a Vontade como synthese do Estado, e, com Krause, comprehende o direito como um principio de coordenação, só com a differença de que o philosopho allemão deduzia-o da propria essencia do Bem, manifesta na consciencia, ao passo que o sr. Oliveira Martins infere-o da observação objectiva de factos biologicos e sociaes.A indole d'este trabalho, e a forçada rapidez com que escrevo, inhibem-me de consagrar á apreciação do systema exposto o espaço que seria preciso. Por isso resumo em poucas palavras a impressão que me deixou a recente leitura do sr. Oliveira Martins.Muito antes d'este illustre escriptor, em 1830, o eminente Silvestre Pinheiro Ferreira combatia a representação dos individuos, consagrada nas instituições da Inglaterra e dos Estados Unidos, e d'ahi trasladada para todos os paizes liberaes. Queria a representação dos tres estados: propriedade, industria, serviços publicos, subdivididos esses estados nas suas classes naturaes. «É falso, dizia elle, que n'um determinado assumpto em que divergem especialistas, possam ter opinião segura individuos dotados apenas de conhecimentos geraes; é absurdo que uma opinião de especialistas possa ser annullada por uma maioria de homens que não têem, para julgar o objecto em discussão, senão aquelles conhecimentos geraes.» (Cours de Droit Public interne e externe, pag. 373 e seg.).Seja dicto de passagem que este absurdo, se o é, seria sempre inevitavel desde que não houvesse para cada classe um parlamento soberano.Não me parece que a representação dos estados ou das categorias resolvesse as difficuldades sentidas por aquelles illustres pensadores; e ainda que tal se conseguisse, não seria isso de realisação facil e immediata.Em primeiro logar, essa representação não faria variar o suffragio pelo que respeita á sua extensão. Deixava-o como está, como a historia o produziu. E o grande inconveniente de attribuir o direito de voto a individuos analphabetos subsiste n'esta theoria, como necessariamente tem de subsistir em todas, porque a razão dos homens cultos é e será sempre impotente contra a corrente dos factos consummados. Além d'isto, o suffragio universal não ficaria efficazmente descentralisado, visto que todos os cidadãos da mesma categoria teriam egual ingerencia politica; e é certo que de individuo para individuo da mesma classe ha muitas vezes maior differença de nivel intellectual do que de classe para classe ou de categoria para categoria. Isto pelo que respeita á eleição da maior parte dos representantes; para a de alguns, propõe o sr. Oliveira Martins o suffragio universal em unidade de collegio, o que não diminue, antes aggrava os actuaes inconvenientes.A organisação dos grupos naturaes e convencionaes da sociedade é necessaria, será utilissima, mas isso resolverá, quando muito, metade das difficuldades; ainda fica tudo o que se refere á adaptação d'um delicadissimo instrumento politico, qual é o suffragio, a individuos e classes que não sabem usal-o, não comprehendem a sua funcção, nem calculam o seu effeito.Por ultimo, afigura-se-me que a lei é inefficaz para influir nas classes um novo espirito de solidariedade, e o que ellas têm não lhes dá a cohesão e disciplina necessarias para a realisação prática d'aquelle projecto. Tendo desapparecido as razões historicas que mantiverem cada classe dentro da sua area definida; tendo acabado a necessidade que havia de resistir, por aquelle meio, a conflictos que já hoje não podem ter logar, julgo que o Estado, havendo de limitar-se a consagrar o que existe, não lograria a pretendida reorganisação, que, por outro lado, o preconceito radical prejudicaria por todas as fórmas. Se o nosso paiz não chegou a comprehender ainda a necessidade e a virtude do principio de associação…].

Por outro lado, a legislação eleitoral muda, transforma-se sempre dentro de curtos periodos, revelando-se assim frequentemente a desillusão padecida pelos povos, que teem de repellir, por inefficazes, as suas creações no dia seguinte ao da producção d'ellas. A propria Inglaterra, tão adherente ás suas tradições de toda a ordem, excepciona, a este respeito, o temperamento da sua raça.

Que explicação tem este grave conflicto, em que estão empenhados os mais distinctos entendimentos e os mais importantes interesses do nosso tempo? Tem a seguinte: a imprudentissima antecipação de reformas, que o povo, a ultima e mais numerosa classe da sociedade, está longe de comprehender e executar, e a manifesta impossibilidade de restringir faculdades, que a lei e o costume consagraram como direitos.

É certo que na Suissa e nos Estados-Unidos o suffragio universal funcciona menos imperfeitamente; mas o povo d'essas duas florescentes republicas tem uma longa educação democratica, e, sobre tudo, uma larga descentralisação administrativa e politica, e por isso o voto individual dos seus cidadãos satisfaz, pelo menos, a estes requisitos de todo o legitimo suffragio: interesse immediato e especialisação do saber. Nos outros paizes o regimen unitario annulla estas duas condições, e causa lastima, profunda lastima, ver como a humanidade culta relucta ahi infructuosamente com a fatalidade d'um legado historico, que não sabe aproveitar e não póde repellir!

Partindo da mesma comprehensão d'este phenomeno social, são diversissimas as direcções seguidas pelos pensadores que consideram e sentem as difficuldades do problema. Uns limitam-se, no maior desalento, á negação pessimista de todo o progresso. Outros, tão insensatos e estereis como aquelles, esperam que o suffragio universal se curará a si mesmo todos os males, como se fosse alguma cousa mais do que um instrumento material, manejavel a quaesquer impulsos! Não falta quem se contente com ostentosos programmas das reformas a operar para que o voto politico seja uma realidade efficaz, esquecendo-se de que taes reformas só em muito distante futuro são realisaveis, e de que, no entretanto, a suspensão do suffragio universal é absolutamente impossivel. Ha, emfim, alguns espiritos melhormente avisados, que, vendo as cousas como ellas são, curam de applicar desde já ao suffragio universal um systema de modificações que o torne mais racionavel na sua organisação e menos damnoso nos seus effeitos. Para estes toda a discussão dos fundamentos do suffragio é abandonada por ociosa e inutil. Elles sabem que são totalmente indifferentes ao interesse real dos povos as controversias apparatosas, que podem entreter os ocios d'uma sabia academia, mas não accrescentam um ceitil á economia das sociedades, nem despontam a rudeza das infimas classes, que, sem saberem para quê, nem porquê, estão hoje investidas dos supremos poderes.

Acceito o pensamento d'este grupo de pensadores, e já procurei servil-o formulando e desenvolvendo a grande verdade da representação proporcional[5 - Principios e Questões de Philosophia Politica-I.]; e hoje continúo o primeiro trabalho, examinando uma questão, tambem eleitoral, que a França retomou ainda ha pouco, e exhibiu ao mundo n'aquella magnifica fórma com que esta gloriosa nação avulta e sobredoira sempre todos os assumptos que a impressionam sériamente.

Esta questão versa sobre a unidade ou multiplicidade de nomes na lista de cada eleitor.




II


O suffragio politico é concedido para a formação de assembléas legislativas, ou de corporações incumbidas da administração local. Para que elle produza, pelo melhor modo, o seu resultado, qual d'estas duas cousas será mais conveniente: a votação de cada eleitor n'um só nome, destinado a representar um determinado circulo, ou a votação de lista com muitos nomes, que ficam constituindo a representação collectiva d'uma area mais larga?

Do simples enunciado da questão resalta já que ella é de pura fórma, extranha ao que poderia chamar-se, em linguagem antiga, a essencia do suffragio. O que se debate é o valor relativo de dois processos empregados para a consecução da mesma cousa, de dois modos de aproveitar praticamente uma força, que, em qualquer d'elles, subsiste como era.

Não partem da mesma ordem de idéas os que defendem o voto uninominal e os que rompem lanças em defesa da lista multipla. Aquelles preoccupam-se mais do interesse e da competencia do eleitor; estes visam principalmente á melhor constituição das assembléas politicas. Os primeiros representam, n'esta questão, a escola que considera o suffragio como um direito; os segundos pertencem á que considera o voto politico, não como um direito do homem, mas como o privilegio do cidadão, subordinado aos interesses geraes do Estado.

Diga-se de passagem que esta distincção tem um grande sabor metaphysico. Contra a comprehensão do suffragio como um direito insurge-se a anthropologia, estudada pelos modernos processos; contra a definição d'elle como privilegio levanta-se a historia da sua generalisação, póde dizer-se que até ao limite extremo, nos mais adeantados povos da Europa e da America.

É á philosophia naturalista do seculo XVIII que se deve a idéa de que todos os homens, pelo só facto de serem homens, devem ter egual participação no governo das sociedades. A declaração dos direitos do homem e do cidadão, com que abre a constituição franceza de 1793, consagra, no art. 6.º, este principio: a liberdade tem por fundamento a natureza. Esta phrase vem da Encyclopedia.

Mas a natureza, como a entendia aquelle seculo, não é qual a descrevem as sciencias de hoje. Era então um mixto de factos positivos e de abstracções idealistas, um conceito absoluto de que era facil deduzir as mais ousadas consequencias. E passava-se da natureza para a sociedade, importando ao regimen d'esta as mesmas illusões egualitarias que a sciencia consagrava n'aquella. Se a natureza é a mesma em todos os homens, todos os homens devem ter os mesmos direitos politicos. Era este o raciocinio, sympathico ás inferioridades sociaes, fulminante para as tradições estabelecidas, excellente como instrumento de negação, mas falso, falsissimo, como base da nova ordem de instituições, que era necessario edificar sobre os escombros do passado.

O naturalismo de hoje formúla conclusões oppostas áquella doutrina. Buffon e Diderot são triumphantemente combatidos por Darwin e Haekel. É já verdade incontestada que os progressos da civilisação, differentes de povo para povo, e, dentro do mesmo povo, de classe para classe, produzem novas faculdades naturaes, e que a obra do esforço humano se perpetúa conjunctamente nas paginas da historia e na anatomia do cerebro.

A este modo de explicar as desegualdades sociaes corresponde a doutrina que considera o voto como um encargo, na phrase de Stuart Mill[6 - Gouvern. Représ., pag. 226.], ou como um direito publico, por opposição a direito natural, na linguagem de Bluntschli[8 - La Politique, pag. 275.]. O direito de suffragio, diz este illustre professor, não é um direito natural do individuo, como pretende o Contracto Social, mas um direito publico derivado do Estado, existindo só no Estado, não podendo servir contra elle. É como cidadão, não como homem, que o eleitor vota; elle não deduz oseu direito de si mesmo, das necessidades da sua existencia, ou do seu desenvolvimento pessoal, mas da constituição do Estado, e para bem d'este.

Infelizmente as lições da moderna biologia e as profundas theorias dos mais eminentes publicistas vieram tarde, demasiadamente tarde. A revolução politica, que estendeu a todas as classes a faculdade de intervirem na gerencia social, sem consideração pelo seu estado mental e pela sua situação economica, estava já consummada quando vieram a lume aquellas verdades. E uma revolução feita é uma fatalidade indestructivel; deixa sempre na organisação dos povos um elemento novo, bom ou máo, mas tão firme, tão persistente como as camadas geologicas que se sobrepõem na constituição do nosso planeta.




III


Quando, no verão passado, a questão da lista multipla (scrutin de liste) appareceu no parlamento francez por uma proposta do deputado Bardoux, defensores e adversarios d'ella invocaram a historia dos dois regimes eleitoraes, querendo os primeiros mostrar que estavam com as mais genuinas tradições republicanas, e sustentando os segundos, com inflammado interesse, a these opposta.

Sem embargo de ser pouco edificante vêr uma das mais brilhantes assembléas do mundo dividir-se assim na interpretação de factos tam proximos e tam geraes, é certo que a intenção de todos elles era perfeitamente legitima, porque a melhor prova d'uma instituição pratica é a experiencia que d'ella se faz.

Houve exaggero de um e outro lado, mas da parte dos que pugnavam pela lista multipla estava maior porção de verdade historica. A lei de 22 de dezembro de 1789, a primeira que a França teve sobre liberdade politica, mandava fazer as eleições pelo voto plurinominal, e do mesmo modo dispunham a Constituição de 1791, o decreto de 12 de agosto de 1792, a Constituição de 1793 e a do anno III. Este systema, hybridamente combinado com o do suffragio uninominal, atravessou todo o periodo da Restauração, e só em 1831, no estabelecimento da monarchia de julho, foi que elle teve de ceder, ficando em vigor, até 1848, o suffragio por circulo, que a revolução d'esta data aboliu logo por um acto do governo provisorio, sendo a lista multipla adoptada para a formação das duas assembléas republicanas. O principe L. Bonaparte, ainda presidente, substituiu-lhe o voto uninominal, que serviu admiravelmente, em todo o tempo do imperio, aos nefastos intuitos d'este famoso aventureiro. A terceira republica reviveu o regimen eleitoral de 1849, e foi por elle formada a assembléa de 1871. Substituido pelo outro systema em 1875, voltou, no anno corrente, a ser proposto, questionado apaixonadamente e por fim votado na camara franceza, depois d'um dos mais notaveis discursos com que a poderosa eloquencia de Gambetta tem illuminado a tribuna de Mirabeau; e se a fortuna lhe foi adversa no senado, talvez isso se deva antes a rivalidades pessoaes do que a divergencias de doutrina.

D'este summario historico vê-se que a democracia franceza tem decidida predilecção pela lista multipla, que ainda póde invocar em seu favor as malquerenças dos ministros de Luiz Philippe e dos cortesãos de Napoleão III.

Menos avisado andava, pois, o deputado Charles Boysset, relator da commissão que deu parecer contrario á proposta de Bardoux, quando escrevia que aquelle systema eleitoral não tinha honrosos precedentes; e ainda menos feliz quando a paixão e o interesse partidario o levavam á injustiça de dizer que a assembléa de 1848 era mediocre de espirito e de coração! A grande voz de Gambetta vingou nobremente a memoria da revolução de 1848 n'estas eloquentes palavras: A assembléa constituinte d'esta epocha está acima de todas as aggressões e de todas as criticas, quer se falle do seu coração, quer do seu espirito. Todos podem julgar, á sua vontade, o coração das assembléas, mas o brilho do talento, o prestigio dos caracteres… Qual é o talento, o genio, o illustre homem politico que não tinha logar na assembléa de 1848, com excepção do sr. Guizot? Eu vejo-os ahi todos. A sua politica pertence ás disputas dos homens, mas não o ascendente do seu espirito, da sua auctoridade. Eu creio que, depois da Convenção, a assembléa de 1848 é a maior que a França tem na ma historia.

A camara de Versailles não merecia ao eminente orador uma phrase de rehabilitação; mas, n'um dos mais distinctos movimentos da sua eloquencia, o suffragio universal e a lista multipla ficaram salvos d'essa prova, pela reacção que logo operaram contra as suas proprias fraquezas.

Os adversarios da proposta de Bardoux não podiam sustentar-se dignamente n'este campo. O voto plurinominal, segundo o espirito d'aquella proposta, é vulneravel em alguns pontos, mas, como logo veremos, não se lhe póde negar a qualidade de ser, mais que outro qualquer systema, favoravel á formação de assembléas fortes pelo seu pensamento politico e luzidas pela distincção intellectual dos seus membros. E esta qualidade, sempre consideravel, é hoje preciosissima, porque os deveres da civilisação, instantemente reclamados em toda a parte, só podem ser satisfeitos por situações politicas muito definidas e muito vigorosas.

Na nossa prática constitucional foram já adoptados os dois regimens. Estabelecida a eleição directa, começou-se pela lista multipla. Consagra este systema eleitoral o decreto de 30 de setembro de 1852[8 - «Art. 38.º A eleição de deputados faz-se por circulos eleitoraes.«Art. 39.º Os circulos elegem um deputado por cada 6:500 fogos.«Se a fracção restante dos fogos de qualquer circulo eleitoral for egual ou superior a 4:332 fogos, eleger-se-ha mais um deputado.«Art. 40.º O continente de Portugal, as ilhas adjacentes e as provincias ultramarinas são, para este fim, divididas nos circulos que constam do mappa juncto.«O numero de deputados, que compete a cada circulo eleitoral, é o que se acha designado no mesmo mappa.»Segundo este decreto, o continente, as ilhas adjacentes e as provincias ultramarinas comprehendiam 48 circulos, e elegiam 156 deputados. D'estes circulos o maior, pertencente ao districto de Vizeu, tinha 47:416 fogos, e elegia 7 deputados. Faziam excepção ao principio geral, estabelecido n'este decreto, os circulos de Macau e de Solor e Timor, cada um dos quaes elegia sómente um deputado.].

Durou sete annos este regimen, que não pôde resistir á valente opposição que lhe fez José Estevão. A lei de 23 de novembro de 1859 foi inspirada por este glorioso orador, que, d'essa vez, desserviu um pouco a liberdade que elle tantas vezes honrara com o seu talento e com o seu caracter, porque não pôde prever que o systema de 1859 ainda havia de produzir peores resultados, muito peores, do que o de 1852.

No relatorio do projecto, que se converteu n'aquella lei, diz-se: «A commissão adopta o principio dos circulos pequenos, propondo um só deputado por cada circulo. Buscando assim a unidade e a verdade da representação, e procurando obter a expressão genuina de todas as opiniões e conveniencias das povoações, considerou a commissão que os interesses locaes são distinctos, mas não contrarios ao interesse geral, e que este não póde compôr-se senão da somma de todos aquelles.» E com estas poucas idéas, variadamente paraphraseadas nas duas camaras, correu toda a discussão d'um projecto importantissimo, que interessava á propria existencia da liberdade, porque esta tem, com o suffragio politico, a mesma estreita relação que as funcções vitaes têem com os seus respectivos orgãos!

Estudada nas sessões das camaras, aquella discussão é d'uma esterilidade absoluta. Não ha alli um argumento estatistico, uma consideração pratica, uma alta theoria, a comprehensão, por qualquer modo manifestada, de que se questionava o mais momentoso assumpto que póde ser sujeito a assembléas politicas. Passou-se d'um para outro regimen eleitoral, sem que o systema revogado fosse convencido da sua iniquidade, e o que vinha substituil-o recebesse a calorosa consagração que os amigos da liberdade offerecem sempre ás novas fórmas d'este augusto principio. Pois na camara, que votou a lei de 23 de novembro, estavam os eloquentissimos oradores José Estevão e Rebello da Silva, e batia o coração do sincero democrata F. Coelho do Amaral!





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notes



1


Politique Actuelle, pag. 249.




2


La Politique, pag. 277 e 278.




3


Les elections nouvelles et la vieille politique-Revue de la Phil. Posit., septembre-octobre, 1881.




4


As Eleições, pag. 24.

N'este opusculo, fortemente pensado e escripto com grande eloquencia, procura o sr. Oliveira Martins resolver o problema eleitoral pela representação organica das categorias sociaes. Apreciando a obra do radicalismo individualista, que só foi excellente na sua parte critica, attribue-lhe com evidentissima razão a geral desordem de interesses e de idéas que caracterisa a evolução politica do nosso tempo. «Por ter cahido a crença no principio esoterico, onde se estribava a hierarchia das classes, cahiu tambem a organisação inteira. Ao apagar-se a luz dentro do sanctuario desabaram as paredes por terra. Em nome da liberdade prégou-se a destruição de tudo. Do principio de que em todos os homens havia capacidade juridica egual, deduziu-se o de que, entre os homens, eram todos aptos para tudo, e assentou-se em que á lei não cumpria especialisar funcções, nem dividir o trabalho, nem tornar independentes os orgãos sociaes. Opinou-se e fez-se. A sociedade passou, em nome da liberdade, a ser uma massa inorganica de homens, um cahos, onde os individuos, como os elementos nas edades geologicas, deixam debater e debatem os seus interesses e paixões, agitando-se á tôa, inteiramente entregues a si, e abrindo por tal fórma a era das revoluções e das crises permanentes ou successivas» (pag. 35).

A observação é profunda e exacta. O gravissimo defeito da nossa civilisação está aqui apontado com coragem e verdade. Cahiu em descredito o optimismo dos que pensavam que as consciencias individuaes, libertas das pressões antigas, tinham, de propria iniciativa, o poder de se organisar, e que a solidariedade humana era um sentimento universal, independente de qualquer consagração politica. A reacção contra a concepção atomistica do Estado é um facto geral na mais moderna sciencia; mas, como é natural, não falta quem a exaggere fóra de termo e medida. O ultimo numero da Philosophia Positiva dá conta de um livro em que Armand Hayem intenta provar que as classes sociaes constituem fórmas tão irreductivas como as de especie e de raça! A verdade é muito menos do que isto. As classes têm um estreito laço de união, que é a communidade do mesmo interesse profissional, mas isso não é bastante para alterar as linhas predominantes na physionomia moral dos povos. A preoccupação profissional não é tão intensa que importe modificações organicas; por outro lado a successão dos officios ou misteres sociaes dentro das familias é excepcionada a cada momento.

O sr. Oliveira Martins intenta remediar os inconvenientes do actual estado de cousas reestabelecendo a Ordem, não com o velho conteúdo d'este termo, mas com a realidade de todas as forças, de todos os elementos activos, que são o nervo e a substancia das nações. «Desde que a origem do Poder é immanente e social, o modo de tornar concreta ou positiva essa auctoridade é constituil-a por meio da reunião de todos os orgãos da sociedade n'um corpo uno. Esses orgãos são de varias naturezas: são as classes ou profissões, base economica da sociedade; são as escolas e as instituições, base intellectual e administrativa; são as regiões, base natural e geographica. A reunião d'esses orgãos constitue a sociedade, e o Estado, que a exprime syntheticamente, têm de formar-se por emanações ou delegações de cada um d'elles.» Os periodos transcriptos resumem o pensamento todo do eminente publicista, que, com Hartmann, considera a Vontade como synthese do Estado, e, com Krause, comprehende o direito como um principio de coordenação, só com a differença de que o philosopho allemão deduzia-o da propria essencia do Bem, manifesta na consciencia, ao passo que o sr. Oliveira Martins infere-o da observação objectiva de factos biologicos e sociaes.

A indole d'este trabalho, e a forçada rapidez com que escrevo, inhibem-me de consagrar á apreciação do systema exposto o espaço que seria preciso. Por isso resumo em poucas palavras a impressão que me deixou a recente leitura do sr. Oliveira Martins.

Muito antes d'este illustre escriptor, em 1830, o eminente Silvestre Pinheiro Ferreira combatia a representação dos individuos, consagrada nas instituições da Inglaterra e dos Estados Unidos, e d'ahi trasladada para todos os paizes liberaes. Queria a representação dos tres estados: propriedade, industria, serviços publicos, subdivididos esses estados nas suas classes naturaes. «É falso, dizia elle, que n'um determinado assumpto em que divergem especialistas, possam ter opinião segura individuos dotados apenas de conhecimentos geraes; é absurdo que uma opinião de especialistas possa ser annullada por uma maioria de homens que não têem, para julgar o objecto em discussão, senão aquelles conhecimentos geraes.» (Cours de Droit Public interne e externe, pag. 373 e seg.).

Seja dicto de passagem que este absurdo, se o é, seria sempre inevitavel desde que não houvesse para cada classe um parlamento soberano.

Não me parece que a representação dos estados ou das categorias resolvesse as difficuldades sentidas por aquelles illustres pensadores; e ainda que tal se conseguisse, não seria isso de realisação facil e immediata.

Em primeiro logar, essa representação não faria variar o suffragio pelo que respeita á sua extensão. Deixava-o como está, como a historia o produziu. E o grande inconveniente de attribuir o direito de voto a individuos analphabetos subsiste n'esta theoria, como necessariamente tem de subsistir em todas, porque a razão dos homens cultos é e será sempre impotente contra a corrente dos factos consummados. Além d'isto, o suffragio universal não ficaria efficazmente descentralisado, visto que todos os cidadãos da mesma categoria teriam egual ingerencia politica; e é certo que de individuo para individuo da mesma classe ha muitas vezes maior differença de nivel intellectual do que de classe para classe ou de categoria para categoria. Isto pelo que respeita á eleição da maior parte dos representantes; para a de alguns, propõe o sr. Oliveira Martins o suffragio universal em unidade de collegio, o que não diminue, antes aggrava os actuaes inconvenientes.

A organisação dos grupos naturaes e convencionaes da sociedade é necessaria, será utilissima, mas isso resolverá, quando muito, metade das difficuldades; ainda fica tudo o que se refere á adaptação d'um delicadissimo instrumento politico, qual é o suffragio, a individuos e classes que não sabem usal-o, não comprehendem a sua funcção, nem calculam o seu effeito.

Por ultimo, afigura-se-me que a lei é inefficaz para influir nas classes um novo espirito de solidariedade, e o que ellas têm não lhes dá a cohesão e disciplina necessarias para a realisação prática d'aquelle projecto. Tendo desapparecido as razões historicas que mantiverem cada classe dentro da sua area definida; tendo acabado a necessidade que havia de resistir, por aquelle meio, a conflictos que já hoje não podem ter logar, julgo que o Estado, havendo de limitar-se a consagrar o que existe, não lograria a pretendida reorganisação, que, por outro lado, o preconceito radical prejudicaria por todas as fórmas. Se o nosso paiz não chegou a comprehender ainda a necessidade e a virtude do principio de associação…




5


Principios e Questões de Philosophia Politica-I.




6


Gouvern. Représ., pag. 226.




8


La Politique, pag. 275.




8


«Art. 38.º A eleição de deputados faz-se por circulos eleitoraes.

«Art. 39.º Os circulos elegem um deputado por cada 6:500 fogos.

«Se a fracção restante dos fogos de qualquer circulo eleitoral for egual ou superior a 4:332 fogos, eleger-se-ha mais um deputado.

«Art. 40.º O continente de Portugal, as ilhas adjacentes e as provincias ultramarinas são, para este fim, divididas nos circulos que constam do mappa juncto.

«O numero de deputados, que compete a cada circulo eleitoral, é o que se acha designado no mesmo mappa.»

Segundo este decreto, o continente, as ilhas adjacentes e as provincias ultramarinas comprehendiam 48 circulos, e elegiam 156 deputados. D'estes circulos o maior, pertencente ao districto de Vizeu, tinha 47:416 fogos, e elegia 7 deputados. Faziam excepção ao principio geral, estabelecido n'este decreto, os circulos de Macau e de Solor e Timor, cada um dos quaes elegia sómente um deputado.



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